Eleições na ALEMA: o STF deveria procurar o que fazer

Publicado em   01/dez/2024
por  Caio Hostilio

Por advogado Marcos Lobo

A tese do Solidariedade, na ADI que protocolizou no STF para o tribunal “eleger” o Othelino, é fajuta. Mistura de aventura, fantasia, desvario e sofisma da pior qualidade.

A petição deveria nem ser recebida e conhecida.

A tal simetria (o princípio da simetria), criação do STF, se aplicada, seria para o que diz a Constituição, que nada diz sobre resultado empate de eleições nos parlamentos brasileiros.

Em nenhum lugar da Constituição há determinação para os parlamentos estaduais seguir/copiar o regimento interno da Câmara, a título de aplicar a tal simetria. E por que da Câmara e não do senado? Eis a questão.

Basta ler o próprio dispositivo citado na ação do Solidariedade: “Será de quatro anos o mandato dos Deputados Estaduais, aplicando-se-lhes as regras desta Constituição sobre sistema eleitoral, inviolabilidade, imunidades, remuneração, perda de mandato, licença, impedimentos e incorporação às Forças Armadas.” (§ 1º do art. 27).

Ou seja, APLICANDO-SE-LHES AS REGRAS DESSA CONSTITUIÇÃO, e não do regimento interno da Câmara Federal.

Depois de ler a peça se observa que a ADI não visa o controle objetivo de constitucionalidade, pois revela apenas uma desavença subjetiva do deputado Othelino, o perdedor de uma eleição, com a deputada Iracema, a vencedora.

No caso concreto do Maranhão, o processo do Solidariedade deveria ser arquivado, pois claramente tem características subjetivas, porque em processo de ADI etc. o julgamento deve ser, ou deveria, ser objetivo. Análise abstrata de norma.

Em ADI não se julga caso concreto. O que o Solidariedade tenta fazer é contornar essa restrição.

Como é caso concreto, o questionamento deveria ser na Justiça Estadual comum do Maranhão. Mas foram tentar contornar diretamente no STF.

Se o STF cumprir minimamente as regras da ADI, arquiva o processo.

Se o STF avançar no julgamento e tiver que criar alguma regra uniforme para todos os parlamentos do país, já que nada diz a Constituição sobre o assunto, que seja o mesmo das eleições para cargos eletivos, que é a da idade, norma existe no Brasil, pelo menos, desde 1965, no art. 110 do Código Eleitoral (“Em caso de empate, haver-se-á por eleito o candidato mais idoso”).

Lógico que, como o STF estará a criar regra nova, ela só pode surtir efeito para frente. Não pode retroagir, afinal é regra que irá penalizar a deputada Iracema eleita nas eleições. São aqueles preceitos/direitos/princípios/garantias estabelecidos na Constituição da República e na Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica) etc. que falam da anterioridade e da irretroatividade da lei, da proibição do novatio legis in pejus”, da proibição do in malam partem” etc.

Por enquanto me dispenso de citar cada preceito constitucional e convencional que atestam a injuridicidade da pretensão do Solidariedade e de seu eventual acolhimento pelo STF, mas, se preciso for, voltarei aqui para fazê-lo.

Como não sei se o STF criará essa nova regra pretendida pelo Solidariedade/Othelino, e por que em evidência no Brasil a questão das cotas, o STF deveria criar uma regra com escalonamento. Tipo: desempata em favor de candidata mulher, do candidato negro, do candidato índio, do candidato que frequentou escolas públicas, do candidato LGBTIA+, do candidato de mais idoso, …., e, por fim e em último lugar, o candidato que tiver maior quantidade de mandatos eletivos, como quer o deputado Othelino. Afinal, maior quantidade de mandatos eletivos, numa sociedade tal desigual como a brasileira, até certo ponto, é sinal de privilégio.

Aliás, eu fico a me perguntar se o STF vai criar uma regra nova para agradar um grupo político do Maranhão, segundo comentam, a pedido de um ministro. E os afetados deveriam, nas suas defesas, lançar essa indignação, pois, para usar uma fala comum do Ministro Gilmar Mendes, “é disso que se trata”, ou seja, criar uma regra nova para dar um golpe político num poder legislativo estadual, passando por cima da Constituição que prevê, expressamente, a autonomia dos Estados membros e de seus poderes.

E tem mais: já não basta a situação constrangedora do STF não julgar um processo que impede a composição de um tribunal de contas? Estão esperando formar maioria na ALEMA para, por exemplo, escolher o deputado Lula, que se candidatou à vaga no TCE e não teve êxito?

Penso ser o caso de todos os parlamentos estaduais se habilitarem no processo, pois o resultado do processo poderá provocar intervenção nas suas autonomias, sobretudo se o STF criar a nova regra e determinar a aplicação retroativa, para além de se deixar a porta aberta, na verdade, escancarada, para futuras outras intervenções indevidas na autonomias dos estados membros da federação.

Garantias, direitos e princípios constitucionais e convencionais estão em jogo no julgamento desse processo. As atenções devem ser redobradas, pois, embora seja inconstitucional a pretensão do Solidariedade/Othelino, não se desconhece que o STF, por exemplo, já chegou a ponto de esvaziar absolutamente o princípio constitucional e convencional da presunção da inocência (o que provocou na prisão do Lula, alimentou o mostro da Lava Jato, elegeu o Bolsonaro etc.) e, recentemente, voltou a esvaziá-lo para os casos do tribunal do júri.

Eleger o deputado Othelino presidente na ALEMA e deseleger a deputada Iracema, diante de tantos e graves casos de ativismo do STF, será café pequeno.

Vamos ver se o STF se dar o devido valor e se colocar o seu devido lugar de Corte Constitucional e fique atento para não ser manipulado e se deixar tornar uma espécie de longa manus” de um grupo político-eleitoral do Maranhão.

É hora dos eventuais atingidos – os parlamentos estaduais, a ALEMA e a deputada Iracema, acompanhada de toda a chapa eleita – terem a coragem de fazer o devido e necessário constrangimento epistemológico ao STF.

  Publicado em: Política

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