Em uma disputa acirrada, que levou o Palácio do Planalto à mesa de negociação, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, foi reeleito para novo mandato à frente da Casa no biênio 2023-2024. Com 49 votos, Pacheco derrotou o ex-ministro do governo Jair Bolsonaro Rogério Marinho, que ficou com 32.

Na tentativa de conter dissidências na base aliada e garantir voto em Pacheco, o governo do presidente Lula prometeu ao União Brasil, ao MDB e até ao PSD diretorias de autarquias, estatais e bancos públicos. A estratégia barrou a chegada de um bolsonarista ao comando de um dos três Poderes, já que o presidente do Senado é também o chefe do Congresso.

Presidente Lula ao lado de Arthur Lira e Rodrigo Pacheco, reeleitos presidentes, respectivamente, à Câmara dos Deputados e ao Senado Federal nesta quarta. Foto: Evaristo Sá/AFP

O triunfo de Pacheco significa uma vitória para o governo, que o apoiou, mas o PT passou por apuros. Marinho tinha o aval do Centrão, o apoio aberto de Bolsonaro e chegou a ameaçar o senador mineiro. O placar da votação revelou que o presidente contará com uma base de sustentação apertada no Senado para aprovar reformas.
O grupo de Marinho e até mesmo aqueles que se movimentaram para trair Pacheco mostraram ao Planalto que Lula enfrentará dificuldades para aprovar, por exemplo, uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC). Não sem motivo: votações assim essa exigem 308 votos na Câmara e 49 no Senado.

Pacheco passou pelo teste político justamente com esse patamar, oito votos a mais do que o mínimo necessário para vencer no primeiro turno. A poucos metros do Salão Azul do Senado, o presidente da Câmara, Lira , obteve uma vitória acachapante, com 464 votos, reforçando o poder do Centrão.

Barganha

Diante desse cenário, tudo indica que o governo terá de entrar na barganha política. Na Câmara, Lula ficará refém do Centrão e deve ter uma oposição forte em um Senado com perfil conservador. Dos 81 senadores, 32 preferiram ir contra Pacheco e o PT.

Até agora, na lista de cargos prometidos pelo governo a aliados nos Estados estão diretorias do Banco do Nordeste, Banco da Amazônia, superintendências da Sudam, Sudene e Suframa, do Departamento Nacional de Obras contra as Secas (Dnocs) e até do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit). A presidência da Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf), conhecida como “estatal do Centrão”, deve ficar com o União Brasil.

Na prática, a disputa entre Pacheco e Marinho ganhou contornos de terceiro turno entre Lula e Bolsonaro, principalmente nas redes sociais. O senador Eduardo Girão (Podemos-CE) desistiu do páreo pouco antes da votação e anunciou apoio a Marinho, ex-ministro do Desenvolvimento Regional.

infographics
Em conversas reservadas, ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) também entraram em campo, mas para solicitar respaldo a Pacheco. Estavam preocupados com o ressurgimento de pautas bolsonaristas, caso Marinho ganhasse, como a defesa do impeachment de ministros da Corte e da criação de uma CPI para investigar o que aliados do ex-presidente chamam de “abusos” do Judiciário.

Polarização

Três semanas depois dos atos que depredaram o Palácio do Planalto, o Congresso e o Supremo, a campanha no Senado escancarou o clima de radicalização no País. Após ser reeleito, Pacheco pregou a “pacificação”, mas ressalvou que isso não significava leniência com vandalismo.

“A polarização tóxica precisa ser erradicada de nosso País. Acontecimentos como os ocorridos aqui neste Congresso Nacional e na Praça dos Três Poderes, em 8 de janeiro de 2023, não podem, e não vão, se repetir”, discursou o presidente do Senado. “Os brasileiros precisam voltar a divergir civilizadamente, precisam reconhecer com absoluta sobriedade quando derrotados e precisam respeitar a autoridade das instituições públicas.”

Ao lembrar que foi muito atacado pelo “gabinete do ódio” nas mídias digitais, Pacheco defendeu a regulamentação das redes, sob o argumento de que elas não podem ser “terra sem lei”.

Marinho criticou a manutenção do grupo de Pacheco no poder e fez uma referência indireta ao senador Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), que comanda a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e é fiador político do presidente do Senado. “Repetir os mesmos métodos e esperar resultados diferentes é, no mínimo, irracional”, disse Marinho. Alcolumbre devolveu com uma provocação. “Só aí ele perdeu cinco votos. Tem muito senador que gosta de mim”, afirmou.

Michelle chegou a entrar no plenário para conversar com senadores. Questionada se Bolsonaro não havia retornado dos EUA, onde está desde 30 de dezembro, por receio de ser preso, a ex-primeira dama rebateu: “Não é ele que tem de ter medo de ser preso”.

Poucos minutos depois, o ministro da Secretaria de Relações Institucionais, Alexandre Padilha, apareceu no Salão Azul do Senado. Articulador político do Planalto, ele adotou o discurso oficial de que o governo não iria interferir na disputa, mas defendeu Pacheco.

Ao ser perguntado o que achava de Michelle pedir votos para Marinho, Padilha respondeu de pronto. “Eu acho que o fato de o marido dela ter fugido do País, não ter passado a faixa presidencial e ter se recusado a admitir a derrota não é um bom cartão de visita”, alfinetou. Deputado eleito, Padilha e outros dez ministros foram exonerados por Lula apenas para assumir seus mandatos no Congresso e votar nos candidatos do governo.

Acerto

A composição da Mesa Diretora do Senado ainda será definida nesta quinta-feira, 2. Petistas temem que Pacheco e Alcolumbre queiram isolar o PL de Marinho. Avaliam que, se isso ocorrer, a oposição ao governo pode aumentar.

Pelo acerto fechado até agora, o MDB ficará com a primeira vice-presidência; o União Brasil, com a segunda vice, e o PT terá a primeira secretaria. Apesar das críticas relativas à concentração de poder, Alcolumbre não quer abrir mão do comando da CCJ.