São Paulo atingiu, ontem, a média móvel de 421 mortes diárias pelo coronavírus, a maior desde o início da pandemia no estado, número que leva em conta o saldo dos últimos sete dias. Nas últimas 24 horas, foram 617 óbitos pela doença e a ocupação em leitos de Unidade de Terapia Intensiva (UTI) destinados à covid-19 chegou a 89%. A situação de São Paulo confirma aquilo que o Observatório Covid-19, elaborado pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), constatou: que o Brasil passa pelo “maior colapso sanitário e hospitalar da história” e que 24 estados e o Distrito Federal estão com taxas de ocupação de leitos de UTIs iguais ou superiores a 80%.
São Paulo está na fase emergencial, a mais dura, desde segunda-feira. Durante coletiva de imprensa, ontem, o governador João Doria afastou a possibilidade de enrijecer ainda mais as medidas restritivas por ora, afirmando que essa decisão caberia à equipe Centro de Contingência da Covid-19. De acordo com o coordenador Paulo Menezes, ainda é necessário mais tempo para ver quais “resultados efetivos” serão alcançados com as medidas implementadas nesta semana.
Dados do governo paulista apontam que, ontem, o índice de isolamento no estado estava em 43%, apenas um ponto acima do registrado terça-feira. Desde o início da pandemia, o Centro de Contingência tem alertado que a meta seria a de elevar essa taxa aos 60%, com 70% sendo o número ideal.
“A situação é absolutamente crítica. De modo urgente, é fundamental ampliar e intensificar conjunto de medidas não-farmacológicas, com medidas de supressão ou bloqueio da transmissão e do uso de máscaras de proteção como principal medida de controle e redução do número de casos por covid-19, buscando reverter ou evitar colapsos no sistema de saúde, para reduzir drasticamente os níveis de transmissão e de casos e, consequentemente, o número de mortes evitáveis”, propõe o monitoramento da Fiocruz.
De acordo com o Observatório Covid-19, divulgado na terça-feira, no momento atual, são 24 estados e o Distrito Federal com taxas iguais ou superiores a 80% de ocupação de UTIs, sendo que, desses, 15 apresentam taxas iguais ou superiores a 90%. Em relação às capitais, 25 das 27 estão com percentuais de ocupação de leitos para adultos iguais ou superiores a 80% — 19 delas, além de 90%.
Comparando-se os números dos estados obtidos na última semana (08/03), verificou-se uma melhora em Roraima, onde a taxa de ocupação caiu de 80% (crítica) para 73% (alerta intermediário) e a volta do Pará à zona crítica (taxa de ocupação saltou de 75% para 81%). Além disso, cinco unidades da Federação que estavam na zona intermediária passaram à crítica: Amapá (90%), Paraíba (85%), Alagoas (84%), Minas Gerais (85%) e Espírito Santo (89%). Apenas o estado do Rio de Janeiro e Roraima permanecem na intermediária, embora muito perto de passar à fase crítica (veja mapa acima).
Nas capitais, o Observatório Covid-19 aponta as seguintes cidades como às portas do caos: Porto Velho (100%), Rio Branco (100%), Manaus (80%), Macapá (96%), Palmas (98%), São Luís (87%), Teresina (98%), Fortaleza (94%), Natal (95%), João Pessoa (93%), Recife (84%), Maceió (86%), Aracaju (90%), Salvador (87%), Belo Horizonte (93%), Vitória (95%), Rio de Janeiro (90%), São Paulo (91%), Curitiba (98%), Florianópolis (98%), Porto Alegre (103%), Campo Grande (88%), Cuiabá (100%), Goiânia (96%) e Brasília (97%) — Boa Vista apresenta taxa de 73% e Belém, de 72%.
“Este quadro absolutamente crítico resulta em impactos diretos e indiretos sobre a saúde da população e trabalhadores da saúde que vêm trabalhando na linha de frente de resposta à pandemia. Apesar de ocupação inferior a lotação máxima de 100%, vários locais apresentam filas de espera por leitos, o que configura situação de colapso no atendimento”, alerta o Observatório.
AGU nega desinformação de Bolsonaro
A Advocacia-Geral da União (AGU) negou perante o Supremo Tribunal Federal (STF) que o governo Bolsonaro tenha compartilhado uma peça de desinformação (fake news) ao difundir valores repassados aos estados no final de fevereiro. As publicações feitas pela Secretaria de Comunicação Social (Secom), e difundidas pelo presidente, foram alvo de uma ação movida pelos estados do Maranhão e da Bahia, que alegam suposto uso de perfis institucionais para a difusão de informações enganosas.
A tabela foi divulgada pela Secom e compartilhada por Bolsonaro em 28 de fevereiro, na esteira das ações do governo federal para atribuir aos governadores a responsabilidade pela evolução crítica da pandemia de covid-19. No dia seguinte, 18 chefes de Poder Executivo estadual afirmaram que a União produziu uma informação distorcida para “gerar interpretações equivocadas e atacar governos locais”.
Os procuradores-gerais do Maranhão e da Bahia acionaram o Supremo cobrando a remoção das publicações e uma correção pela Secom e por Bolsonaro. Segundo os estados, a União inseriu na tabela valores que são de repasses obrigatórios previstos pela Constituição — ou seja, pagamentos que o governo federal deve realizar de qualquer jeito. No entanto, os procuradores-gerais apontam que a publicação omitiu esse fato com o objetivo de apontar suposta “caridade” do governo federal aos estados e colocar nas costas dos governadores a culpa de suposto mal uso da verba pública.
Para a AGU, tal interpretação é um “ressentimento político” e a Secom não ocultou informações, pois o post apontou que a tabela tratava do “valor total de repasses federais aos estados”. “Não são consistentes, portanto, as alegações autorais de que haveria distorção (‘fake news’) nas informações divulgadas pela Secom”, afirmou o advogado-geral José Levi Mello Júnior. “O fato de as informações não estarem detalhadas ou dispostas da maneira que mais convém aos estados autores não é fundamento para que elas sejam submetidas a juízo censor dessa Suprema Corte e/ou sejam reputadas como distorcidas, muito menos como falsa”, salientou.
A AGU também falou que, em relação às contas de Bolsonaro, o presidente atuou como um “cidadão” e não como chefe de Estado. Por isso, não seria possível imputá-lo a argumentação de que estaria usando a comunicação oficial do governo para “difundir informação distorcida”. “O presidente da República, utilizando seu perfil privado, apenas replicou notícia publicizada (porque já era informação pública do Portal da Transparência) pela Secom, e não o contrário”.
A divulgação da tabela no final de fevereiro levou as redes bolsonaristas a espalharem a narrativa do governo, afirmando que R$ 837,4 bilhões haviam sido enviados pela União aos estados — ou seja, estariam com dinheiro sobrando para combater o vírus. A tentativa de repassar responsabilidade causou desconforto até em governadores aliados do Planalto, como Ronaldo Caiado (GO), Ratinho Júnior (PR) e Claudio Castro (RJ), que subscreveram a nota crítica ao governo federal no último dia 1º.
Publicado em: Política