JB
“O Brasil não tem partidos políticos. Tem apenas facções que se reúnem nas épocas de eleição para disputar o poder”. Com essa afirmação, o desembargador Marcus Faver, ex-presidente do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ) centra suas críticas às instituições do Estado brasileiro. Em sua avaliação, elas são responsáveis por provocar “descrença e desconfiança” na população, criando o que, citando Bertolt Bretch, classificou como “analfabetos políticos”, pessoas que se abstém de participar ativamente da política.
De acordo com a explanação de Faver, “não pode haver democracia sem legitimidade dos governos e organização política justa”. Ele explicou porque, na sua visão, o país carece de legendas que representem realmente partidos políticos:
“O partido político é uma organização que tem como base interesses comuns. Ele tem como objetivo chegar ao poder para aplicar seu programa partidário e são o canal através do qual o povo é representado. Hoje, pessoas que tinham oposição total antes se unem como se nada tivesse acontecido”, argumenta, lembrando que esse sistema “não tem representatividade nenhuma”.
<:figure>Quando presidido por Faver, o TRE-RJ foi o primeiro a impedir o registro de candidatos com a ficha suja, inspirando o projeto de lei que levou este nome. A medida adotada na época acabou derrubada nos tribunais superiores. Hoje, ele também critica o Judiciário por não cumprir a função que lhe é devida. Cita exatamente o exemplo da Justiça eleitoral por também liberar a criação de novos partidos:
“A sociedade descrê cada vez maisem sua Justiça. Temosuma crise do direito, de direitos e da Justiça, o que são coisas diferentes. A crise do direito é porque nossa regulamentação jurídica deixa a desejar. Hoje temos um monte de siglas de aluguel. Se o STF tivesse mantido a cláusula de bloqueio, nossa estrutura partidária seria bem melhor. Há ainda a questão do voto secreto dos parlamentares. Deputado não pode ter voto secreto porque está lá para nos representar”, questiona.
O desembargador também acredita que vivemos uma “crise da Justiça”, que se origina dos “desvios de poder”. Cita a burocracia, a arbitrariedade, a corrupção no exercício da função pública como fatores centrais que impedem, de fato, um Estado democrático de direito.
Questionado sobre a responsabilidade das elites políticas e econômicas brasileiras nos problemas que relacionou, Faver foi crítico, inclusive com os jovens:
“Nós falhamos. Acabamos por votar em pessoas que não poderiam estar nos cargos que estão. Eu me preocupo também com a inércia da nossa juventude. Nós não deixamos bons exemplos”.
Luz no fim do túnel
Apesar do tom questionador e crítico, o desembargador se diz otimista com o futuro da democracia brasileira. Para ele, mesmo em situações consideradas retrocessos, como o julgamento sobre os “contas-sujas”, há uma evolução.
“É claro que nós temos avanços. O percentual que deu a vantagem para que as contas não fossem analisadas agora foi por um fator técnico. Foi porque a Resolução foi publicada agora e não poderia atingir os fatos passados. Mas, daqui para frente, nós já evoluímos para admitir que as contas sejam apuradas. Às vezes nosso desejo de avançar nos deixa frustrados, mas a mudança está vindo, gradativamente estamos melhorando. Estou convencido que estamos melhorando, mas não tão rápido quanto a gente desejava”, explica.
O magistrado cita a Lei da Ficha Limpa como um grande exemplo positivo para a sociedade, no que tange a mudança das estruturas políticas:
“Acho que a campanha da Ficha Limpa conscientizou a população de que ela tem força para melhorar”, completa.
Publicado em: Governo