Com informações do Estadão
Um dos pontos mais discutidos no Brasil depois da redemocratização seria a devassa nas práticas corruptas que sempre houve nos três poderes brasileiro. O primeiro poder a ter seus armários e arquivos – mais secretos – vindos à tona foi o Executivo… Não demorou em nada para que o Legislativo fosse palco de várias devassas, porém o poder Judiciário causa até hoje certo receio por parte da mídia e dos outros dos poderes.
Mas a briga interna no Judiciário está trazendo à tona a devassa de uma caixa preta jamais divulgada como agora.
A crise do Judiciário brasileiro, escancarada na semana passada pela liminar do ministro Ricardo Lewandowski que paralisou as investigações da Corregedoria Nacional de Justiça, já é reconhecida nos bastidores desse Poder como uma das maiores da história, pelos efeitos que terá na vida do Supremo Tribunal Federal (STF). Estudiosos vêem nela, também, um divisor de águas. Ela expõe a magistratura, daqui para a frente, ao risco de consolidar a imagem de instituição avessa à transparência e defensora de privilégios.
Ministros do STF ouvidos dizem não se lembrar de uma situação tão grave desde a instalação da CPI do Judiciário, em 1999. Mas agora há também suspeitas pairando sobre integrantes do Supremo, que teriam recebido altas quantias por atrasados. ‘Pode-se dizer que chegamos a um ponto de ruptura, porque muitos no Supremo se sentem incomodados’, resume o jurista Carlos Ari Sundfeld.
Na outra ponta do cabo de guerra em que se transformou o Judiciário, Eliana Calmon, a corregedora nacional de Justiça, resume o cenário: ‘Meu trabalho é importante porque estou certa de que é a partir da transparência que vamos ser mais respeitados pelo povo.’
O que tirou do sossego o Poder Judiciário foi a decisão do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) de mexer na ‘caixa preta’ dos tribunais, ao inspecionar as folhas de pagamento e declarações de bens de juízes, em especial os de São Paulo. A forte reação dos investigados leva o advogado e professor de Direito Constitucional Luiz Tarcísio Ferreira, da PUC-SP, a perguntar: ‘Se há uma rigorosa vigilância da sociedade sobre o Executivo e o Legislativo, por que o Judiciário ficaria fora disso? Se esse Poder nada deve, o que estaria temendo?’ Ferreira arremata: ‘Os juízes sabem que quem paga os seus salários é o povo.’
Um duelo de notas de ministros e associações de juízes se seguiu e integrantes do Supremo se dividiram entre o CNJ e seus críticos. Integrantes e ex-integrantes do CNJ observaram que esse tipo de inspeção do Judiciário não é novidade, mas ganhou intensidade porque desta vez está voltada para o maior e mais poderoso Tribunal de Justiça do País, o de São Paulo. Dizendo-se indignada ‘em relação às matérias jornalísticas’ que implicavam o ministro Lewandowski, a Associação Paulista de Magistrados contra-atacou no ato, avisando: ‘A direção do TJ-SP franqueou à equipe do CNJ todas as informações pertinentes’.
Eliana Calmon ressalva que o temor de muitos magistrados pode resultar de um desconhecimento da situação. ‘O Judiciário, como um todo, desconhece a gravidade da situação (de corrupção). Quem conhece? A corregedoria, porque a ela são encaminhados todos os males. Tanto que os corregedores (locais) estão, em sua grande maioria, ao meu lado e sabem que existem denúncias muito graves. A magistratura desconhece. Por quê? Porque a gente não fala. As investigações são todas sigilosas.’
Maior tribunal do País, TJ-SP sempre foi desafio do CNJ Com mais de 60% dos processos da Justiça brasileira, mais de 45 mil servidores e dois mil juízes, segundo números divulgados pela corregedora nacional de Justiça, Eliana Calmon, o tribunal de São Paulo era tido no CNJ como um desafio já em administrações anteriores, quando o presidente do órgão não era Cezar Peluso, ex-integrante do TJ paulista.
Para piorar a situação, no centro da crise do Judiciário, a corregedora nacional de Justiça, Eliana Calmon, recebeu R$ 421 mil de auxílio moradia. A verba extra foi paga aos magistrados que como ela já atuavam em 2000, quando houve uma decisão judicial concedendo o benefício.
Ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) também receberam o dinheiro. De acordo com notícias divulgadas na semana passada, o presidente do STF, Cezar Peluso, e o ministro Ricardo Lewandowski ganharam até R$ 700 mil de auxílio moradia relativos à época em que os dois integraram o Tribunal de Justiça (TJ) de São Paulo.
A revelação dos pagamentos surgiu no mesmo momentoem que Lewandowskiconcedeu uma liminar suspendendo uma investigação da corregedora para apurar suspeitas de que magistrados teriam recebido recursos ilegalmente. As verbas de auxílio moradia são consideradas legais pela corregedoria porque foram aprovadas pelo STF.
Em São Paulo, a investigação contra magistrados começou após o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) ter informado que foram detectadas 150 transações atípicas. No caso dos juízes, as movimentações são consideradas atípicas quando superiores a R$ 250 mil por ano.
Publicado em: Governo