Portaria passa por cima de regra estabelecida pelo ministro do STF Flávio Dino, que impôs condições não cumpridas em lei aprovada pelo Congresso
O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) publicou nesta 3ª feira (10.dez.2024) uma portaria interministerial com uma “pedalada jurídica” que pretende contornar a derrota imposta pelo ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Flávio Dino. Na prática, o documento libera cerca de R$ 6,4 bilhões em emendas a deputados e senadores ainda em dezembro de 2024. Leia a íntegra (PDF – 137 kB).
O texto é uma forma de contornar a decisão unânime do Supremo Tribunal Federal, por 11 a 0, determinando que as regras para liberação de dinheiro de emendas ao Orçamento sejam mais transparentes (com o nome de cada deputado e senador que propõe o uso de verbas) e com planos de trabalho sobre como os recursos serão empregados. A pedalada legal do Poder Executivo tem apoio do Congresso e passa por cima das decisões de Dino, relator do caso no Judiciário.
A seguir, um resumo do que fixa a portaria:
Pix – o pagamento está liberado, mas os beneficiários têm até 31 de dezembro para apresentar os “planos de trabalho” de cada transferência;
comissão – o pagamento está condicionado à identificação de quem pediu;
área da saúde – emendas empenhadas até 3 de dezembro e que receberam a aprovação do ministério estão liberadas.
O documento é assinado pela Secretaria de Relações Institucionais e os ministérios da Fazenda, do Planejamento e da Gestão. Trata exclusivamente das emendas de 2024 e de restos a pagar de emendas dos anos anteriores.
JUDICIÁRIO X CONGRESSO
Dino bloqueou a liberação de dinheiro de emendas ao Orçamento em 14 de agosto. Há cerca de R$ 25 bilhões represados. O ministro do STF determinou que o Congresso melhorasse as regras de controle dos recursos. Isso foi feito em uma lei que acabou aprovada em 19 de novembro pelo Poder Legislativo.
Dino leu o novo diploma legal e liberou o pagamento, mas com ressalvas –e foi apoiado por todos os ministros da Corte. Os congressistas não gostaram. O governo Lula, por meio da Advocacia Geral da União, pediu ao magistrado que reconsiderasse suas ressalvas, o que foi negado por completo na 2ª feira (9.dez).
Agora, a portaria publicada na edição extra do Diário Oficial da União dá uma pedalada em Dino e vai liberar dinheiro mesmo sem atender a todas as regras impostas pelo ministro. Na prática, nada vai acontecer para impedir o ato do governo, exceto se alguém (um partido político, por exemplo) questionar o STF.
A liberação dos recursos é considerada crucial para que o Congresso aprove ainda neste ano parte do pacote de corte de gastos apresentado pela Fazenda. O governo também quer que deputados e senadores votem até o Natal o Orçamento de 2025 e a regulamentação da reforma tributária. O prazo para que tudo isso ande no Legislativo é de apenas duas semanas, tempo muito exíguo para a dinâmica do Congresso.
A preocupação do governo com o mau humor do Congresso levou Lula a convocar uma reunião de última hora na 2ª feira (9.dez) com os presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), no Palácio do Planalto.
EMENDAS PIX
Ao contrário do que havia determinado o Supremo, a portaria permite que as emendas pix (transferências especiais) sejam transferidas pelo governo antes de terem seus planos de trabalho aprovados –condicionantes para a liberação dos recursos por Dino.
Com a portaria, os recursos já podem ser enviados. Os beneficiários têm até 31 de dezembro de 2024 para enviar ao governo federal os respectivos planos de trabalho. A União, por sua vez, terá até 1º de fevereiro de 2025 para decidir se aprova, aprova com ressalvas ou desaprova o documento.
O texto publicado também permite que este tipo de emendas, quando destinadas à saúde, não sigam os requisitos determinados por Dino se foram empenhadas até 3 de dezembro, quando saiu a decisão judicial.
Quando as emendas pix forem destinadas a organizações sem fins lucrativos, precisarão garantir a publicação dos valores recebidos e aplicados oriundos de emendas a partir de 2020 na internet.
Publicado em: Política